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EditorialNovembro-Dezembro 2021 | Volume 50 - Número 6
Abordagem terapêutica do doente com diabetes mellitus
José Mendes Nunes A diabetes mellitus é importante pela sua prevalência e pela multiplicidade das suas complicações. Em Portugal a sua prevalência é de 9,8% sendo uma das mais elevadas da Europa. Por outro lado, é mais frequente nos homens que nas mulheres (12,1% contra 7,8%) e na população menos escolarizada,(1) logo com menor literacia, o que dificulta ainda mais o seu controlo. Sendo uma doença sistémica, em que nenhum órgão está livre ser afetado, exige uma abordagem integradora muito própria da MGF. Refletindo o compromisso multiórgão da Diabetes mellitus, publicamos dois artigos que abordam o impacto renal e cardíaco. Para além disso, o seu controlo exige, acima de tudo, mudanças comportamentais para as quais não existem moléculas farmacológicas, mas que o “fármaco médico” é o mais potente agente, desde que ele saiba usar a seu potencial terapêutico. Neste número aborda-se a inércia (do clínico) terapêutica, entendida como “a falência do profissional em iniciar ou intensificar uma terapêutica de maneira atempada de acordo com o que recomendam as diretrizes baseadas na evidência”. Não querendo desvalorizar a importância deste comportamento do profissional de saúde, saliento, com veemência, que mais notória é a inércia na promoção das mudanças comportamentais. Esta exige do clínico tempo, conhecimento, mais competências comunicacionais e relacionais, para além do apoio de outros técnicos que cooperem para combater a inércia (agora do doente) para o paciente mudar comportamentos diabétogénicos. Falo da ativação do doente, ou seja, assumir o papel do principal elemento da equipa terapêutica. Quando se pretende persuadir o doente à mudança de comportamentos o clínico deve ter presente três princípios. Em primeiro lugar, levar o doente a falar sobre a mudança, evitando empurrá-lo para situações em que se vê “forçado” a defender o seu ego e o status quo. Em segundo, reconhecer que ninguém muda rapidamente, seja o que for, e muito menos tudo ao mesmo tempo. Logo é importante identificar e validar as pequenas mudanças que o doente faz no sentido da mudança e fazer pequenas mudanças de cada vez, mas de forma decidida e consistente. Finalmente, o clínico deve ter presente que todo o processo de mudança tem inerente a ambivalência, i.e., há forças que impelem para a mudança e outras que se lhe opõem. Pelo que o clínico, quando constata hesitação ou resistência do doente, não deve interpretá-las como recusa absoluta à mudança por parte do doente, mas apenas como uma realidade omnipresente num processo de mudança. Com esta mensagem pretendo vincar que, embora quando se fala da terapêutica da diabetes mellitus se pense em fármacos, não devemos esquecer que antes temos as mudanças comportamentais e, para as quais, o melhor “fármaco” de que dispomos é o médico, de cuja qualidade e poder terapêutico devemos constantemente garantir. Referências bibliográficas 1. Barreto M, Kislaya I, Gaio V, Rodrigues AP, Santos AJ, Namorado S, et al. Prevalência, conhecimento e controlo da diabetes em Portugal: resultados do Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF 2015). Obs – Bol Epidemiológico [Internet]. 2017;2a Série(Especial 9):11-4. Available from: www.insa.pt |